Plinio Martins Filho recebe o Prêmio Rubén Bonifaz Nuño promovido pelo Instituto de Investigaciones Filológicas, no México

Plinio Martins Filho recebeu o Prêmio Rubén Bonifaz Nuño promovido pelo Instituto de Investigaciones Filológicas, no México

Na última terça-feira, 29 de agosto, o professor e editor Plinio Martins Filho recebeu o Prêmio Rubén Bonifaz Nuño promovido pelo Instituto de Investigaciones Filológicas, no México. A honraria foi concedida na inauguração da Feria Internacional del Libro de las y los Universitarios (FILUNI – 2023), na Cidade do México. Em seu discurso, Plinio disse: “São mais de cinquenta anos dedicados ao livro em todas as suas dimensões e processos. Se Jorge Luis Borges escreveu que ‘dos instrumentos criados pelo homem, o mas extraordinário é o livro, pois é a extensão da memória e da imaginação’, de minha parte, apenas acrescento que incorporei o livro como instrumento de transformação de minha vida”. Leia o discurso na íntegra no final da matéria.

Além de Plinio Martins Filho, participaram do evento de abertura Dr. Enrique Graue Wiechers (Reitor da Universidad Nacional Autónoma de México); Dr. Jay Hartzell (Presidente da Universidade do Texas, Austin); Sonia Feigenbaum (Vice-reitora sênior da Vinculación y Compromiso Global, UT); Dr. Francisco Trigo
(Coord. de Relaçõe e Assuntos Internacionais, UNAM); Dra. Rosa Beltrán Álvarez (Coordenadora da Difusão Cultural, UNAM); Mtra. Socorro Venegas (Dir. Gral. de Publicações e Fomento Editorial, UNAM); Arturo Cherbowski
(Diretor Executivo da Santander Universidades); e Robert Devens (Diretor Editorial da Universidade do Texas, Austin).

Assista a cerimônia de abertura na íntegra no vídeo abaixo:

O prêmio, concedido desde 2017, leva o nome do professor, poeta e editor Rubén Bonifaz Nuño (1923-2013). Já receberam esta distinção, que consiste em uma medalha de prata e diploma, Flávia Goulart Mota García Rosa (Brasil, 2017), Sayri Karp Mitastein (México, 2018), Juan Felipe Córdoba Restrepo (Colômbia, 2019) e Joaquín Díez-Canedo Flores (México, 2022). Para o júri – formado por Robert Devens, diretor da The University of Texas Press (EUA); Luis Quevedo, gerente geral da Editora Universitária de Buenos Aires (Argentina); María Isabel Cabrera García, diretora editorial da Universidade de Granada e presidente do Sindicato das Editoras Universitárias Espanholas (Espanha); Sayri Karp Mitastein, diretora da Associação de Editoras Universitárias da América Latina e Caribe e da Editora da Universidade de Guadalajara (México); e Karina Batthyány, diretora executiva do Conselho Latino-Americano de Ciências Sociais (Argentina) – o prêmio concedido a Plinio Martins Filho tem como relevância a sua carreira editorial no meio universitário, suas contribuições à editoração brasileira, a qualidade do seu trabalho com o livro e o seu reconhecimento nesse meio literário por mais de 50 anos. 

O Instituto de Pesquisas Filológicas tem por objetivo preservar e valorizar o cultivo das Humanidades na UNAM (Universidad Nacional Autónoma de México), por meio do desenvolvimento de pesquisas especializadas em línguas nacionais e línguas clássicas (grego e latim), hispânicas e indígenas, cuja função constitui na essência da cultura mexicana, desde uma perspectiva filológica em sentido amplo, assim como incluindo na sua proposta o estudo de outras tradições como o hebraico, o árabe e o sânscrito, a teoria e a crítica literária. Saiba mais sobre o instituto (clique aqui).

PLINIO MARTINS FILHO

Plinio Martins Filho – Mestre e doutor em Editoração pela ECA-USP, onde leciona, e atua no mercado editorial há cinquenta anos (Perspectiva, Edusp e Ateliê Editorial). É autor e organizador de vários livros, entre eles Edusp – Um Projeto Editorial e Manual de Editoração e Estilo, vencedor em 2017 do Prêmio Jabuti de melhor livro de Comunicação. Coordena a coleção Artes do Livro, da Ateliê Editorial, e é editor da LIVRO – Revista do Núcleo de Estudos do Livro e da Edição da USP.

Recentemente aconteceu a publicação, pela editora WMF Martins Fontes, da obra Plinio Martins Filho, Editor de Seu Tempo, de Ulisses Capozzoli, que narra a trajetória de vida e trabalho editorial de Plinio Martins Filho. No livro, Capozzoli não se limita à narrativa do biografado, mas a insere no quadro muito mais amplo da historicidade, acompanhando a trajetória e as contribuições de editores internacionais. Com rigor, Capozzoli dá conta das profundas transformações tecnológicas que impulsionariam a produção editorial, mas também das metamorfoses históricas mais amplas, quer no plano internacional, quer no nacional. A narrativa de Ulisses Capozzoli se consubstancia em deliciosa prosa poética, com momentos de inspirado lirismo. A obra está à venda no site da Martins Fontes (clique aqui).

LEIA NA ÍNTEGRA O DISCURSO DE AGRADECIMENTO DE PLINIO MARTINS FILHO

Em primeiro lugar, gostaria de agradecer à Universidade Nacional Autônoma do México pela outorga do Prêmio Ruben Bonifaz Nuño na modalidade Trajetória Editorial Universitária 2023. Um livro é o resultado do trabalho de um grupo muito especial de pessoas que se dedicam para criar um objeto ameno, bonito, bem feito e que, sobretudo, possa chegar ao seu objetivo final que é o leitor. Não vejo neste prêmio, portanto, apenas um reconhecimento de minha trajetória pessoal, mas também um tributo à dedicação de todos aqueles que trabalharam na produção dos mais de três mil títulos que editei.

Agradeço, neste momento, especialmente a Cristiane Silvestrin e Carla Fontana, ex-alunas e hoje minhas colegas na Editora da Universidade de São Paulo, que propuseram sem meu conhecimento a indicação de meu nome para este Prêmio.

         Agradeço também aos membros do júri, registro a alegria por permitirem que meu nome passe a figurar ao lado de Flávia Goulart Mota Garcia Rosa (Brasil), Sayri Karp Nutastein (México), Juan Felipe Córdoba Restrepo (Colômbia) e Joaquín Díez-Canedo Flores (México), anteriormente agraciados.

         Neste ano, a edição do Prêmio reveste-se de um significado especial, pois estamos celebrando o centenário de nascimento do professor Ruben Bonifaz Nuño, intelectual, poeta, editor, tradutor, um homem de elevada cultura que coordenou por mais de quatro décadas a coleção Biblioteca Mexicana de Autores Gregos e Romanos. Poder trabalhar com textos das mais diferentes origens, produzidos em diferentes momentos da história humana, é uma oportunidade que somente um editor pode desfrutar, e o professor Bonifaz Nuño é um exemplo solar desse privilégio.

         Senhoras e senhores,

         São mais de cinquenta anos dedicados ao livro em todas as suas dimensões e processos. Se Jorge Luis Borges escreveu que “dos instrumentos criados pelo homem, o mas extraordinário é o livro, pois é a extensão da memória e da imaginação”, de minha parte, apenas acrescento que incorporei o livro como instrumento de transformação de minha vida.

         Minha infância no interior do Brasil foi pobre de livros, exceção feita a um exemplar da Bíblia, que não servia para leitura mas para a guarda de dinheiro, na suposição de que ninguém ousaria roubar um objeto sagrado. Creio que essa aura do sagrado, essa manifestação ingênua no poder do livro, pode ter me movido desde então.

         Minha carreira de editor teve o apoio e o incentivo fundamental de pessoas que viviam o livro, pessoas que acreditaram que um migrante do interior levava jeito para a coisa. Jacó Guinsburg, João Alexandre Barbosa, José Mindlin, Jerusa Pires Ferreira, Geraldo Gerson de Souza e tantos outros homens-livro fazem parte do meu acervo de conhecimento e de memórias afetivas. Em minhas aulas sempre fui enfático em insistir em que “o livro de um editor é o conjunto dos livros que ele edita”, e cada um deles é uma página consignada neste meu livro imaginário.

         Destes homens-livro responsáveis por forjar meu espírito editorial, gostaria de destacar um que tem ligação direta com minha presença aqui nesta noite: o professor João Alexandre Barbosa.

         Em 1986, João Alexandre foi convidado para presidir a Editora da Universidade de São Paulo, com a missão de transformá-la em uma verdadeira editora. Tendo editado obras de João Alexandre na editora Perspectiva, fui convidado por ele para colocar em marcha a determinação do reitor. Criar uma estrutura, definir processos, estabelecer linha editorial, traçar parâmetros para formação de catálogo e, sobretudo, criar meios de distribuição dos livros – esses foram os grandes desafios que nos aguardavam. Felizmente, a administração central da Universidade de São Paulo reconheceu a importância da editora na construção de sua missão de extensão à comunidade, e conferiu à Edusp a necessária autonomia de sua gestão. Este cenário possibilitou que a Edusp ganhasse robustez e proeminência em sua participação no mercado editorial brasileiro, o que se traduz em mais de cinco mil títulos publicados desde sua fundação, em 1962.

         É evidente que no Brasil, no México, nos países da América Latina, o mercado exerce enorme pressão sobre as editoras universitárias, exigindo baixos custos, prazos exíguos e adaptação incondicional a regras mercantis estéreis. Mas sua distribuição e meios de divulgação exigem planejamentos e mecanismos adequados à natureza de suas publicações. Isso porque, no caso das editoras universitárias, o objetivo não é o lucro, mas a difusão do conhecimento e a formação de bibliografia especializada.

         Os desafios são grandes, variados e extrapolam a própria atividade editorial. Refiro-me, sobretudo, à formação de leitores e do hábito de leitura, notadamente em uma quadra de nossa história dominada pelo imediatismo e pela velocidade que as tecnologias de comunicação e de informação se nos impõem. Testemunhamos, no entanto, aqui e acolá, iniciativas que tentam mitigar essa deficiência, que muitas vezes é camuflada apenas por sua dimensão monetária. Permitam-me mencionar dois exemplos da Universidade de São Paulo: em 1999, a USP passou a promover sua Festa do Livro, reunindo por alguns dias editoras universitárias públicas e privadas para vender livros com 50% de desconto. Hoje a Festa do Livro da Edusp é, junto com as Bienais do Livro, um dos maiores eventos do gênero no Brasil, brindando o leitor com o acesso a milhares de títulos nem sempre disponíveis em livrarias e no mercado tradicional. Tudo com 50% de desconto!

         Outra iniciativa que vale destacar, desta vez voltada para o corpo discente, foi o programa Bolsa Livro, que entre os anos de 2011 a 2023 levou mais de 200 mil livros a mais de cinco mil estudantes.

         A vida de um editor, no entanto, não deve se pautar somente pela dimensão gerencial e comercial da produção e comércio de livros. A atividade docente é, ao meu ver, o melhor caminho para a formação de profissionais capacitados para enfrentar a realidade que acabo de descrever. Graças à insistência da professora Jerusa Pires Ferreira, concluí meus estudos e prestei concurso para docente no Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo. Confesso que a sala de aula nunca foi minha aspiração, mas nela pude contribuir decisivamente para a formação de editores conscientes de seu papel de disseminação da cultura e de produção de materiais editoriais de qualidade.

         Para concluir:

         Na Veneza do final do século XV, Aldo Manuzio, além de estabelecer inúmeros procedimentos tipográficos que servem de modelo até nossos dias, foi também o primeiro a exercer o papel de editor como o concebemos hoje. Na esteira de seu trabalho, as obras de Platão, Aristóteles, Cícero, Sófocles saíram dos muros das bibliotecas monásticas, e surgiu, assim, uma cultura clássica secularizada.

         Recorro a essa pequena digressão para lembrar que, passados cinco séculos, a edição de textos da Antiguidade constitui um marco relevante no catálogo de toda grande casa editorial. Uma editora universitária deve atender aos diversos segmentos da comunidade acadêmica e representar, por meio de suas edições, o estado da arte da pesquisa na universidade, publicando o que de melhor a instituição produz, em todos os campos do conhecimento, sem exceção. Imbuída do melhor espírito aldino, uma boa editora universitária tem também o papel de complementar a formação do público leitor, buscando fora de seus muros títulos que atualizem e ampliem o conhecimento, com especial atenção à edição de textos clássicos das mais diversas áreas.

         Voltando ao ponto inicial destes agradecimentos: um livro só de torna objeto de cultura se for efetivamente lido! E propiciar isso é o nosso papel, o papel dos editores.

         Muito obrigado!

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