Gravado durante o lançamento de Clichês Brasileiros (Usados por Gustavo Piqueira) em julho de 2013, no Bar Balcão, em São Paulo. Piqueira e Plinio Martins, editor da Ateliê, comentam sobre a concepção do livro e seu singular projeto gráfico, que inclui uma capa impressa em tira de madeira colada à mão com durex.
Quem critica editais acredita demais nas virtudes do mercado, diz José Durand
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O novo livro do sociólogo José Carlos Durand, Política Cultural e Economia da Cultura, lança luz sobre uma questão que aflige o setor há décadas: o que falta para nossa produção cultural tornar-se profissional e sustentável?
A antologia de ensaios cobre o período entre 1995 e 2010, abordando temas como a falta de visão sistêmica na gestão pública, amadorismo na administração da cultura, formação de agentes culturais, leis de incentivo, o papel da crítica e das premiações, além de fazer um panorama comparativo da política cultural na França, Inglaterra e Estados Unidos. Leitura provocativa e essencial para qualquer pessoa envolvida no (ou curiosa pelo) tema.
Em entrevista por email, José Durand comentou alguns dos temas abordados no livro, como a nomeação de artistas para cargos no Executivo, incentivos fiscais para o cinema e a formação de público para eventos culturais de pequeno porte. Leia abaixo:
Um dos temas tratados no livro é a necessidade de profissionalizar a gestão de cultura no Brasil, um contraponto à ideia de colocar “medalhões” das artes para decidir políticas públicas, por exemplo. Você acha que o episódio recente do Ecad, em que um comitê de artistas foi ao Senado pressionar por medidas regulatórias, é um exemplo disso?
José Carlos Durand: O artista ou intelectual consagrado costuma ser impaciente com processos burocráticos e exigências legais, então precisa ser assessorado por gente capaz de lidar com essas situações. Então, prestígio pessoal não é só o que importa. Agora, no caso do Ecad, não foi a visita de “medalhões” que definiu o curso de ação, mas sim uma controvérsia social envolvendo artistas, advogados, fiscais de direitos autorais, gravadoras, promotores públicos etc. Houve até comissão de inquérito. Os “medalhões” foram apenas levantar o brinde ao que havia sido aprovado, e gerar um pouquinho de mídia que não faz mal a ninguém.
Mês passado, o professor e palestrante americano Dov Simens veio ao Brasil e declarou que nossos cineastas estariam “viciados em dinheiro público”. Você concorda com essa visão?
JCD: De um modo geral, críticas como essa partem de pessoas crédulas demais nas virtudes do mercado e nas possibilidades de obter recursos privados a projetos culturais sem antes perguntar se o país em questão tem tradição de real mecenato privado, se tem ou não um parque exibidor aberto a comprar produção independente, se os filmes que o governo financia tem teor cultural, se os cineastas tem uma origem social privilegiada etc. A propósito, por essa lógica, o campo acadêmico cientifico brasileiro seria uma negação total, pois seus projetos de pesquisa são financiados com recursos praticamente só do setor público. É preciso considerar que, em geral, quem acusa cineastas de “viciados em dinheiro público” acredita que, no caso de empresários e banqueiros, tal conduta deixa de ser vício para ser a maior virtude. Ou seja, reclamar e abiscoitar empréstimos subsidiados, a juros negativos, sem nenhuma preocupação com qualquer término ou “porta de saída”, que tanto se cobra de programas de distribuição de renda a quem realmente precisa.
O livro aborda uma questão sensível a todos os campos culturais no Brasil: a dificuldade de formação de público. Seja na música, no cinema ou nas artes plásticas, a sensação é que temos “blockbusters” sazonais que atraem muito público, mas não parecem beneficiar a audiência dos eventos menores, que têm muita dificuldade em chamar atenção. Como se pode diminuir essa diferença?
JDC: A formação de público depende antes de tudo da formação de repertório, que deriva, ao longo do tempo, da educação do gosto e da correlata capacidade de se enfastiar com uma oferta estereotipada e sempre a mesma de bens culturais. Mas é preciso lembrar que a situação é hoje melhor do que antes para os “eventos menores”, devido às novas tecnologias de produção e circulação de bens culturais, e correlato barateamento, o que permite às pessoas navegar mais agilmente em um universo de escolhas muito maior do que algumas décadas atrás. E aos jovens escritores de imprimir seus textos inaugurais e aos jovens compositores e gravadores de registrar sua criatividade e difundi-la em seus círculos.
Quais, na sua opinião, são as medidas mais urgentes a serem tomadas para profissionalizar e fortalecer a política e economia culturais no Brasil?
JCD: O mais urgente é fortalecer a qualidade do ensino sobretudo para aquelas faixas etárias mais importantes para a formação de um gosto mais qualificado em matéria cultural. Coincidentemente, é aquela faixa etária (15-20 anos) que está mais exposta às situações de risco nas periferias das grandes cidades e nas regiões economicamente mais atrasadas. E falo de risco meeesmo, inclusive de vida, e não apenas de universo simbólico empobrecido. Do ponto de vista de gestão cultural propriamente dita, orçamento maior para ministério e secretarias estaduais e municipais, com criação de cargos mediante admissão por concurso e plano de carreira. O MinC no período Lula realizou essa ampliação. Lamentavelmente, há um pensamento conservador para o qual toda e qualquer expansão dos quadros do Estado significa sempre e tão somente “inchamento”, “nepotismo” e “ociosidade”. Levar em conta também que estruturação de carreira e funcionários estáveis significa evitar melhor não interromper tudo o que se faz quando mudam os dirigentes, a cada eleição.
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Eromar Bomfim lança Coisas do Diabo Contra em Paraty
by Gustavo Martins • • 3 Comments
Cenas de crime e violência foram presenciadas no último sábado (6), durante a 11ª Feira Literária Internacional de Paraty. Não houve vítimas, apenas espectadores: era o lançamento do romance Coisas do Diabo Contra, de Eromar Bomfim, que teve trechos lidos pelos atores José de Abreu e Domingos Montagner. O evento lotou a Casa do Autor Roteirista, espaço que levou uma programação paralela de debates sobre literatura e audiovisual à Flip.
Nas palavras do autor, “o livro é a história de um assassinato e de um parricídio. Os personagens são revoltados por condição de fraqueza da humanidade, e conseguem resolver esta fraqueza por meio de gestos radicais e violentos”. A trama é contada por um ex-funcionário de Matias Tavares de Aragão, megaempresário cuja perda da mulher lhe causa uma epifania: só o crime justifica a existência. A partir de uma sombria proposta de negócios, ele envolve sua família em uma cadeia de episódios sangrentos. Sem entregar detalhes, o Bomfim completa: “Os personagens elaboram a ideia de que, pela posse do outro, há uma superação da morte”.
O livro tem projeto gráfico elaborado pela Casa Rex, do artista plástico Gustavo Piqueira.
Antes do lançamento, Eromar Bomfim participou da mesa “Sentidos do Crime: Formas Literárias de Tratar o Crime na Literatura e TV”, com Paulo Lins (Cidade de Deus, Suburbia) e Luiz Eduardo Soares (Elite da Tropa), mediada pelo cientista político Carlos Novaes. Os autores falaram sobre suas linhas particulares de exploração do crime como objeto literário: Paulo Lins pelo viés social (“o crime como reação”), Luiz Eduardo Soares pela antropologia e Eromar pela investigação dos limites da crueldade — ou como acabou-se definindo no debate, “o crime como escolha”.
Após o debate e a leitura de dois trechos de Coisas do Diabo Contra — que deram ao público uma ideia das situações extremas a que Bomfim expõe seus personagens –, o autor iniciou a sessão de autógrafos. O livro também terá lançamento em São Paulo, que será anunciado em breve.