A Arte de Argumentar: trechos

A Arte de Argumentar é um dos mais conhecidos livros do linguista Antônio Suárez Abreu. Professor Livre-Docente pela USP, ele consegue um tom claro e objetivo em sua obra, que pode ser lida até mesmo por leigos. A Arte de Argumentar, que acaba de ganhar nova edição, é um guia funcional e didático, que pode beneficiar todas as pessoas que pretendem melhorar os relacionamentos por meio da criatividade e do trabalho em equipe. As sugestões do autor são endereçadas principalmente a executivos, professores, psicólogos, advogados e profissionais de venda. Porém, suas recomendações valem também para quem apenas deseja aperfeiçoar as relações pessoais.  Afinal, o equilíbrio entre a razão e a emoção é uma maneira eficaz de ganhar qualidade de vida. O livro acaba de chegar à sua 14º edição, o que dá a medida de quanto ele já foi lido desde seu lançamento.

Além de reflexões instigantes sobre a importância da argumentação – e sobre como fazer isso – o livro traz capítulos sobre figuras de linguagem, de som e de retórica, além de técnicas de argumentação.

A seguir, você pode ler alguns trechos do livro, para entender como ele pode ajudar, na prática:

Todos nós teríamos muito mais êxito em nossas vidas, produziríamos muito mais e  seríamos muito mais felizes, se nos preocupássemos em gerenciar nossas relações com as pessoas que nos rodeiam, desde o campo profissional até ao pessoal. Mas para isso é  necessário saber conversar com elas, argumentar, para que exponham seus pontos de vista, seus motivos e para que nós também possamos fazer o mesmo. Segundo o senso comum, argumentar é vencer alguém, forçá-lo a submeter-se à nossa vontade. Definição errada! Von Clausewitz, o gênio militar alemão, utiliza-a para definir guerra e não argumentação. Seja em família, no trabalho, no esporte ou na política, saber argumentar é, em primeiro lugar, saber integrar-se ao universo do outro. É também obter aquilo que queremos, mas de modo cooperativo e construtivo, traduzindo nossa verdade dentro da verdade do outro. – p.10

No mundo de hoje e no futuro que nos espera, é muito importante saber gerenciar relação. O mundo está passando por uma mudança em relação ao emprego industrial e rural. No campo, para o futuro, a perspectiva é termos apenas 2% da população interagindo com  uma agricultura altamente mecanizada. Nas cidades, menos de 20% trabalharão nas indústrias robotizadas e informatizadas. O resto (mais de 80%) ficará na área de serviços. Ora, serviços implicam clientes e clientes implicam bom gerenciamento de relação. O trabalho do futuro dependerá, pois, do  relacionamento. Mesmo os profissionais liberais dependem dele. O médico ou o dentista de sucesso não é necessariamente aquele que entrou em primeiro lugar no vestibular e fez um curso tecnicamente perfeito. É aquele que é capaz de se relacionar de maneira positiva com seus clientes, de conquistar sua confiança e amizade. – p. 18/19

A retórica clássica se baseava, portanto, na diversidade de pontos de vista, no verossímil, e não em verdades absolutas. Isso fez com que a dialética e a filosofia da época se aliassem contra ela. Platão, por exemplo, em sua obra chamada Górgias, procura mostrar que a retórica visava apenas aos resultados, enquanto que a filosofia visava sempre ao  verdadeiro. Isso fez com que a retórica decaísse perante a opinião pública (discurso do senso comum) durante séculos. A própria palavra sofista passou a designar pessoa de má-fé que procura enganar utilizando argumentos falsos. O interessante é que o próprio Platão, na sua República, utiliza amplamente os recursos retóricos que ele próprio condenava. Nietzsche comentou, ao seu estilo, que o primeiro motivo que levou Platão a atacar Górgias foi que Górgias, além de seu sucesso político, era rico e amado pelos atenienses. Dizem, também, que um dos motivos do declínio da retórica foi que a experiência democrática dos gregos foi muito curta. Acabou em 404 a.C., quando Atenas foi subjugada por Esparta, ficando assim eliminado o espaço para a livre crítica de ideias e o debate de opiniões. – p. 32

As palavras são escolhidas inconscientemente. É preciso prestar atenção a elas. É preciso prestar atenção também ao som da voz do outro! É por meio da voz que expressamos alegria, desespero, tristeza, medo ou raiva. Às vezes, a maneira como uma pessoa usa sua voz nos dá muito mais informações sobre ela do que o sentido lógico daquilo que diz. Devemos também aprender a “ouvir” com nossos olhos! A postura corporal do outro, suas expressões faciais, a maneira como anda, como gesticula e até mesmo a maneira como se veste nos dão informações preciosas. O poeta e semioticista Décio Pignatari costuma dizer que o homem precisa aprender a “ouviver”, verbo que ele inventou a partir de ouvir, ver e viver. – p. 37

Argumento Do Desperdício

Esse argumento consiste em dizer que, uma vez iniciado um trabalho, é preciso ir até o fim para não perder o tempo e o investimento. É o argumento utilizado, por exemplo, por um pai que quer demover o filho da ideia de abandonar um curso superior em andamento. Bossuet, grande orador sacro, bispo da cidade francesa de Meaux, utilizava esse  rgumento, ao dizer que os pecadores que não se arrependem e, dessa maneira, não conseguem salvar suas almas estão desperdiçando o sacrifício feito pelo Cristo que, afinal, morreu para nos salvar. – p. 60

As palavras são como fios com os quais vamos tecendo nossas ideias em forma de texto. Quando falamos ou escrevemos, vamos retirando da nossa memória as palavras que vamos utilizar. Trata-se de uma tarefa cuja velocidade pode variar bastante. Desde milésimos de segundo até minutos inteiros. Quem não ficou alguma vez parado, no meio de uma frase, à procura de uma palavra? As palavras não são etiquetas que colocamos sobre os objetos, as pessoas, as ideias, os sentimentos, mas maneiras de representar tudo isso. As línguas humanas são sistemas de representação. Quando usamos uma palavra, estamos fazendo uma escolha de como representar alguma coisa. Podemos chamar alguém que ganhou muito dinheiro recentemente de novo-rico, ou de emergente. Podemos dizer, em vez de países comunistas, países de economia centralizada. Argumentando desfavoravelmente a prisioneiros de uma casa de detenção que sofreram violência policial, podemos dizer: – São assassinos, bandidos! Argumentando favoravelmente, diríamos: – São seres humanos, são filhos de Deus! – p. 103-104

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