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Paixão pelos livros e pela leitura

Renata de Albuquerque

 

Está no dicionário. Bibliomania é um substantivo feminino cujo significado é “paixão imoderada de colecionar livros, principalmente antigos ou raros”. Foi a partir desse conceito que surgiu a ideia do livro Bibliomania. O volume reúne textos de Marisa Midori Deaecto e Lincoln Secco, ambos historiadores, escritos para a Revista Brasileiros. Os textos, curtos, falam sobre todo tipo de assunto, sendo o livro sempre o protagonista: das mudanças no mercado editorial, até sonhos, fé e razão. Os autores falam dos livros como falamos de nossos amigos, de pessoas íntimas, numa escrita semelhante a um concerto de voz a serviço do tema, como só os verdadeiros escritores têm a ousadia de fazer.para falar sobre o novo livro e sobre a bibliomania de cada um dos autores, o Blog da Ateliê conversou com eles:

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Como cada um começou sua história com livros? O que levou você a tornar este um assunto importante para sua vida? 

Marisa Midori Deaecto: A história com os livros começa na infância. Eu me lembro bem de que meu primeiro livro foi o Minidicionário Aurélio. Uma vizinha o trouxe, novinho, embrulhado no papel de presente. Eu deveria ter uns seis anos. Adorei! Decorava as palavras, salteava as páginas. Foi amor à primeira vista. Como não havia livros em casa, passei a emprestar dos primos mais velhos os livros que eles liam na escola. Assim formei minha primeira biblioteca literária e isso não termina nunca. Depois, vieram os sebos, as livrarias, a biblioteca do professor Edgard Carone, onde eu realmente me encontrei… os amigos, os livros… os livros e os amigos. E o ciclo se fechou.
Lincoln Secco: Primeiro há sempre a leitura do mundo e não a dos livros. Ouvia histórias de minha mãe, que não lê livros. Via meu pai lendo livros, mas não para mim. Ouvir também é, de certa forma, ler! Depois vieram os livros infantojuvenis da escola e, mais tarde, os livros que se confundiam com a cidade e seus lugares: as livrarias, sebos, bancas. Adquiri-los, manuseá-los e, eventualmente, lê-los tornou-se um prazer físico para mim. Como sabem os amantes do livro, jamais lemos todas as obras que possuímos. Elas nos seduzem, mas nos decepcionam também. Ter livros é aprender a viver. Lemos mais velozes na juventude, folheamos mais devagar na maturidade e, acredito, relemos mais na velhice. A infinitude dos livros que possuímos sempre haverá de se mostrar diante da finitude de nossa existência.

 

Como surgiu a ideia de “Bibliomania”? 

LS: Atendemos a um convite da Revista Brasileiros, uma revista que é também impressa e se somou à defesa do livro.

MMD: Plinio Martins Filho propôs a ideia, a Revista Brasileiros a acatou e Lincoln Secco seguiu na dianteira, pois ele escreve muito rápido. Daí, como ele escreveu o primeiro artigo baseado em uma ideia nossa e, no final, fui em quem o assinou, senti a obrigação moral de escrever para a coluna. E gostei! Gosto de ler os textos dele e de estabelecer um diálogo. Nada sistemático. Mas tudo muito harmonioso, feito com o coração. É uma parceria que começou nos sebos, que ainda não se concretizou em uma única capa de livro, mas que resiste ao tempo em uma mesma coluna e, agora, dentro de uma luva. Como disse: amigos, livros… livros, amigos.
bibliomania_lincoln_miolo_Page_01Que conceito permeia essa publicação? 

LS: Difícil dizer que há um conceito. Se existe, quem pode dizer é a Professora Marisa Midori, a verdadeira especialista na História do Livro. Eu sou um amador. Posso afirmar apenas que há um sentimento comum pelo livro como objeto numa época que insiste em acreditar que ele vai desaparecer. Mas não vai.

MMD: Não há um conceito, mas uma ideia-força: o livro.

 

O que se pretende com “Bibliomania”?

MMD: Apresentar o livro como protagonista na longa história da humanidade. O que soa estranho, afinal, não são os homens os protagonistas de sua própria história? Sim. Mas, então, era preciso discorrer sobre um dos muitos elementos que torna a humanidade minimamente humana, com seus sonhos, seus medos, sua coragem, sua covardia, suas qualidades e seus defeitos. Penso que o livro, nesse sentido, sirva como uma espécie de fermento para cada um dos caracteres que desenvolvemos ao longo de nossa existência. O que também faz dele um protagonista na nossa história.
Como foi a escolha dos textos a serem publicados? 

LS: Publicamos todos os artigos da coluna Bibliomania, sem nenhuma escolha prévia.
Vocês conversam a respeito para não repetir temas ou para tratar de temas correlatos nessa seleção? 

bibliomania_marisa_miolo_Page_01MMD: Não. Eu leio todos os textos que o Lincoln publica. Então, quando escrevo, como disse, já tenho em mente o que veio a lume.

LS: Acredito que tivemos uma trajetória comum. Nós trabalhamos juntos na Biblioteca do Professor Edgard Carone, que era um bibliófilo de esquerda. E nos conhecemos também em longas caminhadas pelos sebos paulistanos. Sendo assim, os artigos na revista jamais se repetiram, apenas se complementaram.
Qual a importância de falar sobre livros no contexto brasileiro atual? 

MMD: Hoje, escrever sobre livros e falar sobre eles pode ser uma forma de escapismo da realidade, como faziam os românticos. Mas pode ser também uma forma de olhar a humanidade de forma mais serena. De pensar o tempo breve com menos ansiedade e crer na História profunda dos homens e dos livros. Falar sobre livros, hoje, pode também ser uma forma de buscar o insumo necessário para se compreender o momento histórico atual e, quem sabe, encontrar forças para a sua transformação. Pois se o livro pode servir como uma espécie de fuga, ele também se nos apresenta como a janela para o mundo. Tudo depende de nossas escolhas.

LS: Há quem diga que o livro vai acabar, como eu citei antes. Ou que o livro, hoje, pode ser qualquer coisa. Para mim, o livro é um conjunto de folhas dobradas, protegidas por uma capa, dotadas de um conteúdo manuscrito, desenhado ou impresso. Se um e-book pode ser um livro pouco me interessa. De fato, o livro pode ter outros suportes como a rocha, a madeira… Mas o livro em papel é o único que me importa. E se for de bolso, ainda melhor, pois posso carregar no trem e ler em qualquer lugar. Se faltar luz, acendo uma vela. Mas pode ter certeza que a “bateria” de um livro é inesgotável.

 

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