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As listas de livros obrigatórios da Fuvest e da Unicamp para 2017

Renata de Albuquerque

Você já está se preparando para os vestibulares do final do ano? Uma das tarefas que exige mais tempo é a leitura dos livros de leitura obrigatória, as chamadas listas do vestibular. E, para 2017, tanto a Fuvest quanto a Unicamp inovaram.

Para falar a respeito deste assunto e para ajudar os estudantes que vão prestar os vestibulares, o Blog da Ateliê entrevista José de Paula Ramos Jr,  professor do curso de Editoração na Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo autor do livro Leituras de Macunaíma: Primeira Onda (1928-1936), e diretor da Coleção Clássicos Ateliê.

fuvest2017

Das mudanças na lista da Fuvest, quais são as mais significativas e por quê?

José de Paula Ramos Jr. Para o vestibular de 2017, a Fuvest mantém o tradicional número de nove obras literárias, consideradas de leitura obrigatória. Em relação ao ano anterior, quatro livros foram substituídos e cinco mantidos. Os que permanecem são os romances Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis; O Cortiço, de Aluísio Azevedo; A Cidade e as Serras, de Eça de Queirós; Capitães da Areia, de Jorge Amado; e Vidas Secas, de Graciliano Ramos. Entre as quatro obras da nova lista há um livro de poemas, um de contos e dois romances, respectivamente: Claro Enigma, de Carlos Drummond de Andrade; Sagarana, de João Guimarães Rosa; Iracema, de José de Alencar; e Mayombe, do escritor angolano Pepetela. Desses, os três primeiros já figuraram em listas da Fuvest. A grande novidade vem a ser a inclusão de Mayombe, cujo autor foi agraciado com o prestigioso prêmio Camões em 1997, por sua notável contribuição para a literatura e a cultura lusófona. Essa obra constitui a mais significativa mudança na lista da Fuvest não só por introduzir nela a literatura africana de língua portuguesa, mas porque induz o ensino médio a incluí-la em seu repertório, assim contribuindo, embora de modo muito restrito, para uma desejável maior aproximação entre a cultura brasileira e a africana lusófona. Além disso, vale notar, Pepetela é o único autor vivo que figurana lista da Fuvest. Não seria interessante incluir também, ao menos, uma obra de escritor português e uma de brasileiro que representem a produção literária nossa contemporânea?

 

Das mudanças na lista da Unicamp, quais são as mais significativas e por quê?

JPRJ: Por oito anos, a lista de obras literárias de leitura obrigatória para os vestibulares da USP e da Unicamp manteve-se unificada. A partir de 2016, a Unicamp optou por uma lista que, além de separada, passou de nove a doze obras. Essa foi a mudança mais importante, cujo modelo se reproduz para o vestibular de 2017, em cuja lista permanecem: uma coletânea de vinte sonetos de Camões; os contos “Negrinha” (do livro homônimo), de Monteiro Lobato, “Amor” (do livro Laços de Família), de Clarice Lispector, e “A Hora e Vez de Augusto Matraga” (em Sagarana), de João Guimarães Rosa; a peça de teatro Lisbela e o Prisioneiro, de Osman Lins; e os romances Til, de José de Alencar, Memórias Póstumas de Brás Cubas, de Machado de Assis, O Cortiço, de Aluísio Azevedo, e Terra Sonâmbula, do escritor moçambicano Mia Couto, único autor vivo da lista que, agora, introduz uma seleção de 45 poemas de Jorge de Lima e os romances Coração, Cabeça e Estômago, de Camilo Castelo Branco, e Caminhos Cruzados, de Érico Veríssimo. Convém advertir os vestibulandos que os poemas de Jorge de Lima pertencem a três obras distintas (Novos Poemas; Poemas Escolhidos; e Livro de Sonetos), que foram compilados no livro Poemas Negros, fora de catálogo, conforme informação da própria Comvest, instituição responsável pelo vestibular da Unicamp. Isso, certamente, é um problema que os candidatos deverão enfrentar.

Unicamp 2017

É possível depreender o que os examinadores esperam dos alunos, com base no conjunto de livros adotados em cada vestibular?

JPRJ: O que os examinadores da USP e da Unicamp esperam dos candidatos quanto aos estudos literários é que, antes de tudo, tenham lido as obras da lista. Todavia essas leituras serão questionadas, basicamente, por meio de duas vertentes: a da percepção crítica dos elementos estruturais dos textos – gênero, tema, narrador, personagens, tempo, espaço, ação e composição da ação (enredo ou trama), estilo (de época e autoral), efeitos de sentido produzidos pela linguagem (elementos de retórica como tropos e figuras) – e a interpretação desses elementos em relação a outras obras literárias, à história e à cultura. Em outras palavras, poderá ser questionada a leitura das obras entendidas quer como artefatos verbais, dotados de relativa autonomia (análise e interpretação intrínseca), quer como eventos culturais que dialogam com outros discursos da cultura, do passado e do presente, em que se manifestem usos, costumes, tradições e valores da sociedade (análise e interpretação extrínseca). O manual da Fuvest (2016) explicita:

 

No que se refere aos textos literários, espera-se o conhecimento das obras representativas dos diferentes períodos das literaturas brasileira e portuguesa. O conhecimento desse repertório implica a capacidade de analisar e interpretar os textos, reconhecendo seus diferentes gêneros e modalidades, bem como seus elementos de composição, tanto aqueles próprios da prosa quanto os da poesia. Implica também a capacidade de relacionar o texto com o conjunto da obra em que se insere, com outros textos e com seu contexto histórico e cultural.

Já para a Comvest, segundo seu manual de 2016:

 

Considerando-se que é possível acessar, por meio da literatura, um tipo específico de experiência acumulada numa cultura, espera-se que o candidato tenha tido contato com textos narrativos, líricos e dramáticos em língua portuguesa. Embora o texto literário se preste, por sua própria natureza, a múltiplas leituras e interpretações, que dependem em parte das circunstâncias histórico-sociais e dos objetivos do leitor, há sempre um núcleo de leituras possíveis que são delimitadas pelo próprio texto e constituem a base para qualquer interpretação posterior. No Vestibular Unicamp, essas leituras são usadas como parâmetro para elaborar as questões e avaliar o candidato quanto ao conhecimento de uma parte representativa de textos literários em língua portuguesa.

 

A partir desse conjunto de livros, podemos perceber que há poucos autores contemporâneos na lista. O que uma lista com tantos títulos clássicos pode representar?

JPRJ: Nas listas de leituras literárias obrigatórias para os vestibulares,a forte presença dos “clássicos” representa o prestígio e a força da tradição no ensino escolar. Afinal, “clássicas” são as obras cuja excelência artística as tornam dignas de serem estudadas em classe (ou seja, em sala de aula), porque são exemplares. Todavia, há obras de autores contemporâneos que poderiam ser contempladas com um quinhão, ao menos, um pouco mais representativo nas listas.

 

A lista da Unicamp tem mais títulos e é mais variada. Existe alguma hipótese do por que isso ocorre?

JPRJ: Quanto à variedade de gêneros, Fuvest e Unicamp selecionaram textos representativos da poesia lírica, do conto e do romance, para os vestibulares de 2017. A única diferença consiste em uma peça de teatro, que está presente na lista da Unicamp e ausente na da Fuvest. Todavia, o teatro já esteve contemplado em listas anteriores da Fuvest e nada impede que volte a figurar em futuras. A quantidade de títulos, por sua vez, não significa, necessariamente, maior número total de páginas de leitura. A Unicamp, por exemplo, requer a leitura de três contos (cada um de um autor diferente), dois deles curtos, enquanto a Fuvest demanda a leitura dos nove contos (mais ou menos longos) recolhidos no livro Sagarana, de Guimarães Rosa. Outro exemplo: enquanto a Unicamp prescreve a leitura de vinte sonetos de Camões e 45 poemas de Jorge de Lima, a Fuvest exige a leitura integral do livro Claro Enigma, de Carlos Drummond de Andrade, composto de 46 poemas cuja leitura será, provavelmente, mais árdua do que a dos poemas selecionados de Camões e de Jorge de Lima. Todavia, o modelo da Unicamp permite, de fato, a abordagem de um maior número de autores.

 

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