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Como entendemos o mundo: as emoções

As emoções e os sentidos das coisas

Antônio Suárez Abreu*

As emoções desempenham um papel importante em nossas vidas.  Às vezes, elas nos fazem desprezar a própria realidade dos fatos.  Se agíssemos apenas racionalmente, ninguém jogaria na Megassena, por exemplo, e ela iria à falência.  Afinal, a probabilidade de ganhar é de uma em 50 milhões.  Só por comparação, a probabilidade de você ser atingido por um raio é uma em 1.576.  A possibilidade de você ser canonizado é de uma em 20 milhões.  Ou seja, é mais fácil você ser morto por  um raio, ou ser canonizado, do que ganhar na Megassena.

 

Durante muito tempo ficamos presos à afirmativa de Descartes de que o homem é um ser racional.  Na verdade, somos seres tanto emocionais quanto racionais.  Segundo António Damásio[4], um dos mais importantes neurocientistas da atualidade, foram as emoções primárias – aquelas que são comuns à espécie, porque inatas e pré-organizadas – que permitiram que nossos ancestrais pré-históricos, reagindo prontamente a algum perigo, sobrevivessem e pudessem passar seus genes à frente.  Todos nós temos essas emoções primárias em nosso sistema límbico e, ainda segundo Damásio, acrescentamos a elas, durante toda nossa vida, as emoções secundárias, aquelas resultantes das nossas experiências.  Alguém que quase se tenha afogado em criança, certamente se lembrará desse fato, quando adulto, cada vez que se aproximar de uma piscina, de um lago ou de uma praia.

 

É costume dizer que, em nosso país, há “leis que pegam” e “leis que não pegam”.   Há, por exemplo, leis de trânsito que limitam a velocidade em determinadas ruas.   Mas, mesmo diante de placas que indicam, por exemplo, velocidade máxima de 40km por hora,  a maioria dos motoristas acelera além dos 40.  É uma “lei que não pegou”.   Não temos vontade emocional de nos submeter a ela.  Como um remendo a essa situação, as autoridades de trânsito constroem lombadas, diante das quais os motoristas têm, forçosamente, que diminuir a velocidade. É uma excrescência que não se vê em países europeus!   Bem, mas por que certas leis não pegam?  Em parte, podemos dizer que falta vigilância e punição, mas, o mais importante é que falta disciplina e, principalmente, disposição emocional das pessoas para cumpri-las.  É nesse momento que podemos falar na importância dos frames, senso comum e comunidades interpretativas.

 

[4]AntónioDamásio, O Erro de Descartes, 1996. (pp. 160-161)

*Tem mestrado, doutorado e livre-docência pela USP, pós-doutorado pela UNICAMP, é professor titular de língua portuguesa da UNESP, membro da Academia Campinense de Letras e autor, entre outros, dos livros: Gramática Mínima para Domínio da Língua Padrão (Ateliê), O Design da Escrita (Ateliê) e Texto e gramática: uma integração funcional para a leitura e escrita (Melhoramentos).

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