Poesia e Erotismo – Breve Nota sobre a “Antologia da Poesia Erótica Brasileira”

Paulo César Cedran*

“São misteriosos o laços que unem a poesia ao erotismo”.
Eliana Robert Moraes

Antologia da Poesia Erótica Brasileira

Das temáticas que já abordei em meus artigos, acredito ser esta uma das mais difíceis de lidar, em especial pelo preconceito e pelos estereótipos que envolvem a temática erótica. O brilhante ensaio que apresenta a Antologia da Poesia Erótica Brasileira escrito pela Prof. Dra. Eliane Robert Moraes e intitulado “Da Lira Abdominal”, apresenta com propriedade esta temática contada em verso nos poemas selecionados.

Mesmo assim, tomei a liberdade de tentar apresentar suas principais considerações quanto à singularidade da poesia erótica brasileira. Eliane busca essa singularidade na idade do ouro do lirismo grego e, em especial na poesia de Safo – poetisa de Lesbos que inaugura a poesia erótica ocidental, sob a temática da homossexualidade feminina. Da insinuação que a imaginação tem em prolongar o encontro amoroso, o passo a seguir será o de considerar que esse prolongamento se manifesta de forma múltipla, seja na pintura, na música e no gênero literário. Neste, o destaque é dado ao poema.

O erotismo, considerado por muitos críticos como um tema de segunda categoria ou mera pornografia, encontrou no poema um terreno em que se torna uma temática recorrente às diversas escolas literárias, que no Brasil nasce com Gregório de Matos e chega a Arnaldo Antunes. Assim, no corpus da obra procurou-se levar em conta tanto as formas literárias populares quanto as eruditas que trataram da temática erótica.

Dessa forma, o chamado rebaixamento da temática pode ser compreendido em duplo sentido, ou seja, o sentido literal por tratar os poemas das partes baixas do corpo humano; como também no sentido metafórico, por tratar de uma forma de amor degradada e/ou centrada no aspecto sensual  e nada sublime do modus vivendi do amor ocidental. Como lidar com esse impasse? Como fugir do lugar comum do explícito que caracteriza o pornográfico, sem deixar que o erotismo vulgarize a temática afetiva? A solução proposta por Eliane Robert Moraes isenta e ironicamente redime os supostos perversos interessados na antologia.

Ítalo Calvino (1923 - 1985)
Ítalo Calvino (1923 – 1985)

Ao buscar em Ítalo Calvino uma chave para a interpretação e solução deste impasse, assim afirma: “Ao submeter a referência sexual a uma estilização, o escritor fica livre para transformar o sexo num observatório a partir do qual se pode contemplar qualquer prisma do universo, incluindo o que está aquém ou além do próprio sexo. Daí que o autor explicitamente obsceno possa ser considerado como formula Ítalo Calvino, ‘aquele que mediante os símbolos do sexo procura fazer falar alguma outra coisa’, sendo que ‘essa coisa pode ser redefinida, em última instância, como outro eros, um eros último, fundamental, mítico, inalcançável.’” (MORAES, 2015, p.27).

Sob esta perspectiva outros olhares desafiantes e libertos da pecha do pecado podem olhar o erótico sob o cunho religioso ou até mesmo filosófico nos moldes propostos por exemplo pelo Kama Sutra indiano. Nos dias de hoje a vulgarização e a banalização do sexo se encontra no auge da fomentação e criação de distorcidos seres desejantes e menos alcançados, que é a união por meio de Eros. Como afirma Claude Calame na obra Eros na Grécia Antiga: “não corresponder ao amor que se oferece, é, portanto, recusar ou romper o contrato de fidelidade que a philotês estabelece, particularmente, pela ligação erótica; e, assim, cometer um ato injusto. (CALAME, 2013, p.18).

Busquemos essa união na fidelidade que se realiza não na mercantilização do corpo tomado como objeto, mas na necessária erotização que divinamente nos humaniza.

*Mestre em Sociologia, Doutor em Educação Escolar pela Unesp de Araraquara, Supervisor de Ensino da Diretoria de Ensino – Região de Taquaritinga, Docente do Centro Universitário Moura Lacerda de Jaboticabal e da Iesp de Taquaritinga.

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