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Outras Figuras na Canção de Chico Buarque

Figuras do Feminino na Canção de Chico BuarqueRenato Tardivo

Figuras do Feminino na Canção de Chico Buarque, ensaio de Adélia Bezerra de Meneses, mapeia o tema da mulher na obra do compositor. Com erudição e, ao mesmo tempo, linguagem acessível, o livro é todo ilustrado com reproduções de Di Cavalcanti, Ismael Neri, Volpi, entre outros, o que amplia as possibilidades de sentido contidas no título da obra – “figuras do feminino” –, e evidencia que as imagens não estão a serviço das ideias mas compõem, também elas, o movimento reflexivo proposto pelo livro.

Nessa medida, se a escrita de Adélia é atravessada pela filosofia, sociologia e psicanálise, a comunicação entre música e artes visuais também permeia a reflexão, da capa à contracapa, em um texto cuja experiência estética fatalmente trará ao leitor as canções de Chico como mais um componente para a fruição do livro. O próprio Chico Buarque, talvez o mais importante artista em atividade do Brasil, trafega por diferentes linguagens – música, teatro, literatura. O ensaio acerta, pois, ao trazer diversas figuras em seu movimento de interpretação: é a obra mesma de Chico Buarque que solicita tal pluralidade.

Acompanhando as nuances das composições do músico, Adélia Bezerra de Meneses dá conta da leitura reflexiva de inúmeras canções, sem que, com isso, o ensaio resulte desamarrado ou, mesmo, sem cair no clichê “Chico é o maior entendedor da alma feminina etc.” Com efeito, a distribuição das análises em capítulos temáticos dá conta das especificidades sociológicas e afetivas, e, dentro destas, das diversas formas que as figuras do feminino se apresentam.

“Quem é essa mulher?”, canta o músico em “Angélica”. “A resposta a essa pergunta”, escreve a autora, “tão reiterada no corpo da canção, encontra-se fora dela […] Desgraçadamente, não há metáforas aqui: as coisas devem ser tomadas na sua literalidade”. Como se sabe, “essa mulher”, Angélica, é Zuzu Angel, estilista que morreu no Rio de Janeiro em um “acidente de carro esquisito e nunca explicado” ao lutar “para deslindar o caso do desaparecimento e morte do seu filho Stuart Edgard Angel Jones”, preso durante a ditadura militar.

Não menos desgraçadamente, há metáforas em “Mulheres de Atenas” ou “Com açúcar, com afeto”; canções que evidenciam marcas de uma sociedade machista. Contudo, “nem sempre a mulher é apresentada como a paladina dos valores da pessoa humana”. A autora, então, também explicita situações em que Chico Buarque opera “uma verdadeira desmitificação da mulher”, como em “Sob medida” e “Se eu fosse teu patrão”.

O ensaio começa com a célebre pergunta de Sigmund Freud – “O que quer a mulher?” –, “questão que remete ao desejo feminino”, mas não só; remete, como escreve a autora, “ao desejo humano”. É assim que, ao explorar as diversas nuances atribuídas ao feminino nas canções de Chico Buarque, Adélia Bezerra de Meneses conclui que a pergunta de Freud deve ser reformulada (e não revelarei a reformulação proposta pela autora, para não estragar a surpresa do leitor).

Mas, cabe dizer, se a ensaísta se autoriza a repensar a questão de Freud, é porque encontra na obra de Chico Buarque, que lê e reescreve com sensibilidade e rigor, motivos suficientes para considerar que muitas são as formas assumidas por essas figuras.

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2 Comentários



  1. E você era a princesa
    Que eu fiz coroar
    E era tão linda de se admirar
    Que andava nua pelo meu país

    Não, não fuja não

    Finja que agora eu era o seu brinquedo
    Eu era o seu pião
    O seu bicho preferido
    Vem, me dê a mão
    CHICO – ETERNO FEMININO

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