|

O Curioso Caso de Benjamin Button: do conto de Fitzgerald ao premiado longa de Fincher

Filme adaptado do conto O Curioso Caso de Benjamin Button

O filme O Curioso Caso de Benjamin Button, lançado nos Estados Unidos em 2008, fez sucesso sob a direção de David Fincher, arrebatando, no Oscar de 2009, os prêmios de Melhores Efeitos Especiais, Melhor Direção de Arte e Melhor Maquiagem. Fazem parte do elenco Brad Pitt e Cate Blanchett, dando vida a Benjamin Button e Daisy, personagens adaptados do conto de Francis Scott Fitzgerald, no qual o filme é inspirado.

Lançado em 1921, o conto faz parte da compilação Contos da Era do Jazz e trata de uma interessante inversão na vida de Benjamin Button, homem que nasce velho e rejuvenesce ao longo da vida, até morrer com a idade de um bebê. O conto revela um recém-nascido extremamente inteligente, que fala e age como adulto, tendo inclusive o tamanho de um adulto real. Quando Benjamin chega perto do fim de sua vida, passa a não lembrar-se de seus tempos de faculdade e trabalho, passa a ter sonhos tranquilos e despreocupados e diverte-se mais com brinquedos do que em qualquer outro momento de sua vida. Diminuindo de tamanho paulatinamente durante o processo de envelhecimento, ele vive os últimos anos em constante regresso, rumo à restrita consciência que um bebê tem do que o cerca, até simplesmente desaparecer.

Quem quiser comparar filme e livro verá que pouco eles têm em comum. Ambas as versões tratam da trajetória de Button, de sua condição diferenciada, de seu casamento; mas a forma como esses elementos são mostrados no filme diverge da versão original. Inicialmente, algumas adaptações tiveram de ser feitas a fim de tornar o filme mais próximo da realidade. No conto, por exemplo, Benjamin nasce não só com a idade de um homem de 70 anos, mas com o tamanho de um homem adulto. No filme, o personagem é mostrado ao nascer com o tamanho de um recém-nascido; no entanto um trabalho incrível de maquiagem se encarrega de proporcionar a sensação da idade avançada. Adaptações como estas são justificáveis ao passo que o conto possui uma maior carga simbólica e metafórica, enquanto o filme se preocupa com a realidade, apesar de tratar da ficção. Haveria, é claro uma impossibilidade física quanto a uma criança de um metro e meio sair do ventre da mãe. Essas adaptações são escolhas que de forma alguma ameaçam a qualidade do filme de Fincher.

O filme trata também, de forma muito mais romântica que o conto, do casamento de Benjamin Button e Daisy – esta, na versão literária, recebe o nome de Hildegard Moncrief. Benjamin conhece Daisy quando ela ainda é uma criança, interpretada por Elle Fanning, enquanto ele tem a idade real correspondente a dela, mas aparenta ser um senhor bastante idoso. Na versão original, de Fitzgerald, Benjamin conhece Hildegard quando ela já está na faixa dos vinte anos e ele, aparentando cerca de cinquenta. O encontro se dá de maneira menos romanceada e o casamento rapidamente acontece. O leitor acompanha o sentimento de perda de admiração do marido pela mulher, devido a vida difícil que o casal leva, ao passo que um envelhece e o outro fica cada dia mais jovem.

Benjamin, que no início do casamento tivera tanto orgulho de sua esposa, passa a manifestar estranhamento frente à mulher que é contraposta ao seu constante rejuvenescimento. Benjamin passa a admirar-se cada vez mais enquanto perde o desejo por sua esposa. Pouca atenção é dada ao momento em que os dois têm a mesma idade, em contrapartida ao filme, que explora fortemente o romance entre os dois neste período e faz de Benjamin e Daisy um casal eternamente apaixonado.

A forma como os outros veem a condição de Benjamin também é bem diferente nos dois casos. Em oposição ao filme, na versão de Fitzgerald, predomina o estranhamento e a crueldade dos personagens secundários para com Button. Logo no início, seu pai apresenta uma rejeição incontestável em relação ao filho. Durante seu crescimento ele é afastado por todos, que o culpam por sua condição julgando ser algo que o próprio Benjamin pode controlar mas não o faz por preguiça ou graça. Benjamin só consegue aceitação quando atinge a meia idade, em que é um homem bem sucedido financeiramente, casado e com filho. Já na terceira idade recomeça seu sofrimento, tendo também contra ele seu filho, que se envergonha do pai e mantém sua condição e relação de parentesco em segredo daqueles que o cercam.

Scott Fitzgerald tem uma linguagem leve e despretensiosa que mantém o leitor preso a sua literatura do início ao fim. Seus contos têm ritmo consistente – um dos segredos do bom escritor – transmitem simplicidade, mas o conteúdo é sempre intrigante e inteligente. Neste estilo “escrever é muito fácil”, Fitzgerald abre O Curioso Caso de Benjamin Button despertando curiosidade, mantém-no cativante durante seu desenrolar e cria um desfecho metafórico, coerente com o restante da obra, cheio de sensibilidade. Caminhando lentamente para a finalização, Fitzgerald o faz com calma – ele devia saber que a pior coisa para o público é ter a sensação de que o autor estava com pressa de terminar o livro – e despede-se de seu leitor, deixando-lhe uma sensação saborosa em mãos.

Coluna Livros em Cena - Laura Ammann

1 Comentário


  1. Muito legal a resenha…!

    Eu assisti o filme em tempos longinquos, já a obra literária não houve oportunidade de apreciar. =)

    Congratulações!

Deixe uma resposta